segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Hans, o Alemão (final)



A Luna tal como é hoje: cega mas feliz!

Capítulo 8

Foram todos vistos cuidadosamente e todos se encontravam de excelente saúde incluindo a Luna. Contudo, embora saudável, esta tinha de facto um grande problema que nos entristeceu muito. A nós pais e à “mamã” que nos cuidava. A Luna era cega.



A Luna é aquela mais escurinha que se arrumava sempre num cantinho...

Foi uma grande tristeza para todos nós, até porque não sabíamos quais seriam as suas possibilidades de ter uma qualidade de vida aceitável.

Devo dizer que vivemos todos, dias de grande apreensão. Os outros cresceram, tornaram-se lindos, educados e, quando independentes, rumaram aos seus lares de adopção.

A Elaine já pronta para ir para a sua futura casa...

Ficámos tristes, foram dias sombrios, mas sabíamos desde início que iria ser assim e que iriam para lares escolhidos, tal como eu…

A Luna, não houve quem a deixasse sair. Adaptou-se lindamente a toda a casa, sobe e desce todos os degraus (por vezes conta mal, e dá mais um saltinho, é muito giro) e não há recanto que não conheça.

Tem seis anos e continua a ser a gata mais mimada por todos.

Eu e a Carlota continuamos apaixonados e bonitos embora mais velhos. Não vou d

izer que não tenha tido já outros devaneios, que tive, mas não passaram disso mesmo, devaneios.

Somos uma grande família feliz!


A Bela Carlota



E eu, o Hans!

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Hans, o Alemão

(Os bebés)

Capítulo 7

O tempo foi passando e a Carlota, que eu agora via muito raramente e apenas de longe, estava pesada, barriguda, mas linda como só ela era.

A “mamã”, aquela senhora baixinha e simpática (que eu já tinha achado muito mais simpática, devo dizer), não tirava os olhos dela acompanhando-a constantemente nos seus passeios e organizando-lhe o quarto com tudo o que eventualmente fosse necessário para o momento crucial que rapidamente se aproximava.

Eu andava cada vez mais nervoso e agitado. Tentava conversar com os amigos, distrair-me, aprender coisas novas, mas nada parecia resultar.

Até que uma bela manhã (era bela de qualquer maneira embora não faça a mais pequena ideia se estava bonita ou cinzenta), a mamã me foi acordar e me trouxe ao quarto dela onde me deparei com a cena mais maravilhosa que algum dia possa ter imaginado. A Carlota estava deitada na sua cama, linda como sempre embora com um ar um pouco fatigado e, junto dela, meio perdidos no meio do seu sedoso pelo encontravam-se quatro lindas criaturas, indefesas, totalmente dependentes, que se agarravam à mãe desesperadamente, tentando alimentar-se. A mãe, sempre serena, aconchegava-os, lambia-os, empurrava-os gentilmente para os mamilos disponíveis, e apresentava-os orgulhosamente para que pudessem ser vistos: Os meus filhos!

Percebi que tinha dois meninos e duas meninas cada um mais lindo do que o outro. Nesse dia e em alguns outros seguintes, pude ficar junto da Carlota partilhando com ela, muito desajeitadamente, devo dizer, as obrigações de um chefe de família.

Estava orgulhosíssimo! Quando vinha para o meu quarto pavoneava-me indecentemente vaidoso perante os meus amigos como se ser pai fosse algo que só eu tinha tido o privilégio de ser.



(A Carlota com dois, enquanto eu tomava conta dos outros dois. Estava exausta a minha beldade)

Bom, o tempo foi passando, os bebés foram crescendo tornando-se cada vez mais bonitos mas também mais irrequietos e todas as atenções eram poucas para evitar acidentes.

Quando começaram a descer as escadas, sempre com a supervisão da Carlota, a minha e, sobretudo a dos elementos humanos lá de casa, verificámos que algo de estranho se passava com a que fora sempre a mais pequena e tinha uma caudinha toda enroladinha em vez das caudas imponentemente compridas dos irmãos, a Luna. Sempre tinha constituído motivo para uma certa apreensão o facto de ter nascido com aquela estranha cauda, mas que agora não conseguisse descer as escadas, caindo constantemente quando os seus irmãos o faziam com toda a facilidade, isso era mesmo preocupante.

(A Luna)

A mamã, sempre atenta, suspeitou que alguma coisa não estivesse bem com ela. Ia buscá-la lá a cima para acompanhar os irmãos ou ela cairia e ficaria a chorar sem saber o que fazer no meio da escada. A Carlota, não lhe ligava muita importância e deixava-a ficar a miar. De princípio estranhei a atitude tendo-a achado até de uma grande insensibilidade e, por vezes, ia lá eu buscá-la. Contudo verifiquei que a Carlota não ficava nada satisfeita e eu levava sempre um raspanete. Percebi mais tarde que a mãe estava a tentar incentivá-la a perder o medo, porque era de medo que a Carlota julgava tratar-se.

Contudo, a tal senhora simpática, verdadeiramente simpática e cuidadosa de quem certamente se lembram, estranhou que este comportamento se mantivesse e há que levar as crianças e a mãe ao médico.



terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Hans, o Alemão


(Imagem: "Freedom versus Fear" by Athelo)

Capítulo 6

Pois é, há sempre um dia na vida que pode virar tudo do avesso. O meu calhou a um domingo em que estávamos todos sentados a conversar, junto à lareira, e em que a Carlota, muito dengosa e a fazer-se a uns miminhos se sentou junto à mamã.

Esta, uma senhora muito arguta, olhou para ela com redobrada atenção e exclamou:

- Carlota! Tu não estás gorda, tu estás grávida!

A frase caiu como um meteoro na sala silenciando todas as conversas.

Mas a Carlota enfrentou corajosamente a senhora. Aliás, mais do que isso, não manifestou o mais pequeno indício de preocupação mas, a verdade é que eu não sabia onde me havia de meter. Estava assustado e intrigado. Entendia que deveria enfrentar tudo e todos indo assim em defesa da minha dama. Esta, por outro lado, estava perfeitamente tranquila, com os olhos semicerrados sem parecer que fosse lá o que fosse que se estava a passar tivesse nada a ver com ela e sem precisar minimamente de ser defendida. E eu ali, assim, sem saber mesmo que fazer.

Estava eu nesta aflição, uma mescla de medo e tentativa de ser audaz, quando percebi que não era de zanga a expressão da senhora do sorriso simpático.

Estava surpreendida, é certo, mas risonha, acarinhando o mais possível a Carlota, fazendo-lhe perguntas acerca do seu bem-estar, das suas necessidades, combinando visitas ao médico, etc.

Com as coisas a correr desta forma comecei também eu a ficar um pouco mais calmo e, orgulhoso e, claro, fui-me aproximando de ambas.

Mas, para mim, afinal a situação não era idêntica.

Com muita meiguice e de forma muito ternurenta, a “mamã” mandou-me sentar ao seu lado e comunicou-me que eu ia ser pai o que, francamente, já tinha percebido, não sou propriamente burro. Mostrei-me, obviamente, radiante e ciente das minhas responsabilidades.

Porém, a conversa não havia terminado e, ainda com doçura mas de forma muito firme, avisou-me que a partir de agora, eu iria ter que ficar separado das meninas e ir para os aposentos dos meus amigos mais velhos, os rapazes da casa, não fosse o diabo tecê-las e haver mais algum deslize com qualquer outra. A verdade é que era um pouco disputado por todas elas. De formas diferentes, é certo, mas não me passavam despercebidas as suas subtis investidas.

Mas, para mim, naquela época, existia apenas a Carlota! E ia ficar separado dela! Ver-nos-iamos, é certo, vivíamos na mesma casa, mas sempre de longe ou na companhia de todos.

Como devem imaginar fiquei completamente devastado pela separação a que me vi obrigado. Estava muito bem instalado, é verdade. Ocupava, finalmente, a suite que me havia sido atribuída desde início; assim uma espécie de apartamento de rapaz solteiro, mas a verdade é que nem todas essas mordomias me animavam.

Foi um tempo triste para mim. Por um lado sentia-me um adulto, o que era bom. Deixara há muito as minhas inseguranças de jovem adolescente para trás e hoje era um adulto bem sucedido. Dava-me bem com a restante rapaziada e passámos momentos agradáveis. Todavia, lá bem no fundo, nunca deixei de sentir aquela pequena aguilhoada no peito que nos faz encolher: a saudade.

A Carlota, a minha amiga, a minha companheira, fazia-me falta.