Só hoje me apeteceu contar-vos um pouco do que foi o meu dia de quarta-feira. É daqueles dias em que temos a sensação que nem sequer devíamos ter acordado. Mas, como temos vida, e temos que a viver, o melhor é andar para a frente e esperar que este entupimento da sanita às 9 horas da manhã, porque eu, distraidamente (estava cheia de cólicas intestinais), despejei para lá um recipiente de feijoada que tinha sobrado na véspera, Carnaval, e já não estava em condições, tendo, seguidamente, com toda a lógica puxado o autoclismo, inundando a casa de banho, o hall, as carpetes…. Fosse o pior que me ia acontecer e, já agora tudo condensadinho num espaço de poucas horas.
Mas não! Desenganem-se os mais crentes. Muito mais me haveria de acontecer absolutamente inesperado.
Como tinha assumido o compromisso de levar a minha sobrinha ao hospital às dez horas para fazer um curativo e verificar de que forma estava a evoluir a intervenção cirúrgica a que havia sido submetida semanas antes, comecei a ficar nervosa, percebendo que, de forma nenhuma, conseguiria cumprir o compromisso do horário.
Ligo para o meu irmão, enquanto ia fazendo um café bem forte a ver se espevitava o intestino preguiçoso e o punha a funcionar em vez de doer apenas e combino com ele ir seguindo com a pequena para o hospital que eu seguiria para lá, logo que algo se desencadeasse. (Ele não suporta assistir a estas coisas – curativos, claro).
Lá venho eu de balde e esfregona para limpar o chão numa mão e com a chávena do café algo periclitante no pires para levar para cima e tomar sentada para ver se acalmava um pouco pois estava já a “estriquinar” (não existe, inventei eu mesma).
A parte do balde e da esfregona correu bem, não tive de subir escadas. Já no que concerne ao café não fui tão afortunada.
As escadas, subi. Sento-me em frente ao computador para aproveitar o tempo em que tomava o café e ir lendo os mails mais urgentes. Dou um primeiro gole no café, o qual me provoca uma engasgadela monumental. Cuspo café para tudo quanto é sítio, inclusive o computador (julgo que ficou viciado pois a partir daí, de vez em quando faz umas piscadelas estranhas) e ponho a escrivaninha em estado de sítio.
Entretanto as cólicas tornam-se bastante insuportáveis e eu naquele impasse estranho de não saber se havia de ir à casa de banho (a outra, uma vez que a primeira estava impraticável. O balde e a esfregona, só por si, não obtiveram resultados visíveis) esforçar-me dramaticamente para que algo acontecesse, ou esperar mais um pouco e tratar de limpar todos os vestígios de café que projectei criteriosamente pelos quatro cantos do quarto onde estava.
Bom, decidi-me pela segunda hipótese uma vez que a primeira palpitava-me que ia ser longa e difícil.
Vou buscar os panos e os detergentes para limpar as manchas de café, para o que tenho de ir ao andar de baixo e passar pelo balde e pela esfregona e decido dar uma primeira limpadela ao estardalhaço que me estava a enervar. Não consigo. Desisto, subo para limpar o café, mas acabo por ir primeiro à casinha.
Por pudor vou saltar esta parte. Apenas vos digo que a coisa foi tão complicada que fiquei pejada de Petéquias, é verdade, Petéquias por todo o pescoço, colo e até zonas adjacentes.
Bom, resolvido este assunto, quiçá o mais grave, lá limpo atamancadamente o café, apanho a água que já se espraiava bem perto da cozinha, coloco os artefactos de limpeza no jardim e volto para dentro para disfarçar ligeiramente as ditas Petéquias (não me canso de repetir. Sinto-me feliz, pois não sabia que era temporariamente possuidora de tamanha raridade) e lá vou feita maluca para chegar ainda a tempo do curativo ou ainda dava algum peripaque ao meu irmão.
Cheguei rapidamente ao hospital. O parque estava sobrelotadíssimo como habitualmente pelo que estaciono à Comandante em cima de um passeio com uma lista amarela, e corro para dentro para acompanhar a minha menina.
Aí começam, finalmente as coisas a correr bem. Encontro o médico (por acaso meu primo) ainda a dirigir-se para o local do curativo e, aparentemente, as coisas estão a ficar melhorzinhas com a menina embora ainda tenha uns tempinhos de pensos e coisas estranhas que lhe enfiam lá para dentro.
Já estava eu prontinha para me vir embora, iniciando as despedidas, quando uma senhora enfermeira, suponho, me dá uma chave para a mão, me indica um cubículo, me manda despir inteiramente, tirar, brincos, anéis, relógios piercings e outros eventuais acessórios e deixa-me apenas com uma bata daquelas que deixam o rabo ao léu, uns sapatos de plástico, muito elegantes, azuis e uma touca verde. Um “ensemble” extraordinário.
Eu, naturalmente, ainda lhe digo que deve haver engano, que eu não vinha para isto, deve ser alguém, que não eu, que deveria estar a preparar-se mas a senhora não foi de modas e disse que era mesmo eu “o Sr. Dr. Tinha mandado” e, eu calei-me…
Só não percebo é como conseguiram tão facilmente levarem-me assim à falsa fé para o bloco sem que eu tivesse grande reacção. Eu sei que ainda disse que não tinha tomado banho, que não tinha feito a depilação, que precisava da perna para conduzir de volta, que o meu encarregado de educação não havia sido avisado… mas nada resultou. Quando dei por ela estava deitada na mesa de operações, uma pequenita que eles lá têm e já estava o outro de seringa e bisturi em punho todo contente a tirar-me uns sinais que eu tinha combinado lá ir extrair talvez aí há uns três anos… Não sei bem…
De seguida, como se já não bastassem as (outra vez) Petéquias, ainda me tira para aí uns trinta cravinhos, ou verruguinhas, daqueles pequeninos, no pescoço, a sangue frio.
Bom, feito isto, lá me vou vestir, ainda um tanto atordoada não por nenhum anestésico mas pela facilidade com que me engramparam, a mim, que até me acho uma pessoa muito fina.
Venho ter com os outros, que entretanto esperaram por mim, ainda um pouco ensanguentada no pescoço e, após as despedidas formais mais as carinhosas, sobretudo essas, lá regresso ao carro (que entretanto tinha um papelinho no pára-brisas que eu não vi) e lanço-me a toda a brida para um local protegido em que não tenha que mexer em nada, sempre com o espectro do que me poderia vir ainda a acontecer.
As recomendações eram vir para casa e pôr a perna ao alto para que não inchasse. E foi assim mais ou menos que fiz. Depois de ir ao health club e permanecer sentadinha no jardim de Inverno a ler um livro e almoçar lá, como estava combinado com a minha filha, vim para casa.
Aqui, após ter estendido uma máquina de roupa, ter programado outra para se fazer durante a noite e ter tentado limpar realmente a casa de banho (tentado porque a minha filha quando me viu com o balde quase me batia), lá me sentei, finalmente para ficar, de perna para cima.
E, estranhamente, consegui terminar o dia sem que mais nada de anormal se tivesse passado.
Francamente, quando me fui deitar e estava a fazer a minha higiene pessoal, olhei atentamente para as Petéquias mais para as pintinhas ensanguentadas que ficaram da extracção das verruguinhas e achei até que me favoreciam bastante.
Afinal nem tudo fora mau.
Observação: isto aconteceu-me realmente, tudinho como aqui está mas já há algum tempo. Penso que no início de Março.
3 comentários:
Que dia o Seu ... :) ...
Digno de um filme , mas é sempre maravilhoso ver a forma como encara tudo o que lhe vai acontecendo ... gosto bastante do seu lado guerreiro , que nao se entrega !...
Beijo para si ... lutadora !...
Meu Deus, que horror; tadinha!
Fazer um filme [2] \o/
Delícia apenas pra quem lê o texto e imagina as situações inusitadas... Mas pra quem vive não é tão engraçado assim, né?
xD
Não. Na altura não é. Embora, pouco depois, no próprio dia, seja capaz de despencar a rir só de contar o que aconteceu...
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